Como escrever um TCC

Assim como discuti no caso do artigo (recomendo fortemente que você leia esse artigo antes), também não existe uma fórmula mágica para um trabalho de conclusão de curso. Apesar disso, vou apresentar ao longo deste texto os aspectos que considero fundamentais para uma monografia. Como os trabalhos que estou orientando usualmente envolvem o desenvolvimento de software, a estrutura que vou recomendar aqui tende a atender melhor esses trabalhos.

Lembre-se: apesar do desenvolvimento de software ser um aspecto importante no trabalho, a criação de um software não necessariamente envolve uma contribuição científica. Em resumo, o software será um meio para discutirmos ou propormos algo, não o fim do trabalho em si. Por isso, não devemos superestimar detalhes extremamente técnicos.

Orientandos, fiquem tranquilos: discutiremos a estrutura adequada para o seu trabalho individualmente.

Estrutura geral

Introdução

1.1. Contextualização

Comece a seção de contextualizando apresentando o problema que você quer resolver e destacando o porquê esse problema é importante. Mencione outras iniciativas que discutam esse problema, propondo soluções ou apontando possíveis causas. Cite artigos que embasem esse problema.

1.2. Justificativa

Explique a importância de desenvolver uma nova pesquisa para abordar o problema que você está explorando. Indique porque a solução que você está propondo parece ser viável e eficaz. Apresente, em linhas gerais, o que você irá fazer o que espera obter como resultado. Cite trabalhos que sugiram a potencial eficácia dessa abordagem.

1.3. Objetivos

Agora, de forma direta, descreva exatamente qual é o objetivo do seu trabalho. O objetivo geral deve ser descrito em uma única linha, complementado por no mínimo três objetivos específicos, todos começando com um verbo, que possibilitam o cumprimento do objetivo principal. Veja um exemplo:

O objetivo geral deste trabalho é investigar a usabilidade em sistemas acadêmicos de universidades. Para que esse objetivo seja alcançado, tem-se os seguintes objetivos específicos:

• identificar os sistemas acadêmicos mais utilizados pela comunidade universitária;
• definir as técnicas e estratégias para a avaliação da usabilidade;
• conduzir avaliações de usabilidade, discutindo seus resultados;

2. Conceitos fundamentais

Este capítulo varia consideravelmente de um trabalho para outro, já que os conceitos a serem abordados mudam. O importante é entender que, assim como no caso do texto em que explico sobre a estrutura dos artigos, apenas os conceitos fundamentais devem ser apresentados.

Durante a escrita deste capítulo, você deverá apresentar as explicações para os conceitos com forte embasamento na literatura. Isso significa que o texto terá muitas citações bibliográficas, o que é natural, já que você não está propondo ou definindo conceitos, mas sim explicando ideias e definições elaboradas por outras pessoas.

Neste capítulo, além de referências a artigos, também costumamos fazer referências a livros. Embora exista uma tendência de se citar apenas trabalhos mais recentes, publicados ao longo dos últimos cinco anos, neste capítulo usualmente admite-se a citação de obras mais antigas, afinal, estamos lidando com a definição de temas e conceitos. É uma prática comum, inclusive, citar em algum momento a obra original em que um termo é definido, independentemente de quando essa definição foi cunhada.

Naturalmente, se quisermos mostrar como aquele tema tem evoluído, podemos citar trabalhos mais recentes, mas este capítulo não tem por finalidade apresentar uma visão geral de como a área está hoje. Ele deve se limitar a apresentar as definições e explicações necessárias para que todo o resto do trabalho seja compreendido por seus leitores.

3. Revisão de literatura

Este capítulo é de fundamental importância em um trabalho científico. Estamos, com a sua pesquisa de conclusão de curso, tentando alcançar alguma contribuição à comunidade científica de uma determinada área. Mesmo que o seu trabalho discuta um problema que sabemos que existe por o vivenciarmos no nosso dia a dia, como a (falta de) qualidade de um sistema, precisamos de embasamento científico para mostrar que esse problema existe e é relevante.

A depender do trabalho, o processo de condução da revisão de literatura pode variar. Em alguns, faremos uma revisão sistemática. Em outros, um mapeamento sistemático ou uma revisão tradicional. Discutiremos juntos qual o melhor formato para isso mas, em qualquer um dos casos, há alguns aspectos essenciais:

• Definir o que queremos descobrir com a revisão de literatura:
  • Exemplos:
    • Encontrar quais técnicas têm sido utilizadas para resolver um determinado problema, bem como as vantagens e limitações de cada uma;
    • Como as soluções propostas para uma problema têm sido avaliadas e quais foram os resultados alcançados;
• Analisar os trabalhos encontrados, responder às questões de pesquisa, encontrar padrões e desafios;
• Indicar, ao fim, como este trabalho se diferencia dos demais. Esta diferença precisa ser sólida e bem fundamentada na literatura, indicando que a estratégia que buscaremos resolver de fato apresenta viabilidade e potencial.

Durante este processo, independentemente da técnica que definirmos para a elaboração deste capítulo, você deverá fazer um registro cuidado das strings de busca utilizadas, das bases científicas consideradas e dos trabalhos encontrados. O uso de uma planilha bem elaborada é fortemente recomendado.

Dica: há diversas ferramentas que podem ajudar neste processo, como Parsifal (para revisão sistemática), Mendeley, Zotero, etc.

4. Materiais e métodos

4.1. Definição da proposta

Chegou a parte mais interessante do processo: descrever exatamente o que você irá fazer em seu trabalho de conclusão de curso. Nesta seção, você deve descrever a proposta do trabalho, partindo da abordagem dividir para conquistar. Como o problema a ser resolvido é grande, você adotou algumas atividades metodológicas (que mudam de um trabalho a outro) e devem ser descritas aqui.

Se o seu trabalho envolve a criação de um software, este deve ser descrito em mais alto nível, apresentando a arquitetura e seus componentes, sem detalhar aspectos técnicos de implementação (linguagem, plataforma, protocolo de comunicação, etc). Valorizar a concepção da solução é mais importante de que essas definições tecnológicas, que devem ser apresentadas na seção a seguir.

4.2. Definições de tecnologia

Agora que você já apresentou a solução em alto nível, chegou a hora de apresentar os aspectos técnicos. Note que eu usei o termo: "apresentar" e não "descrever". Entrar em detalhes técnicos de implementação pode ser tentador, mas apenas os pontos essenciais devem ser apresentados. Se a intenção da pesquisa é avaliar a comunicabilidade de um portal acadêmico, entrar em detalhes quanto à versão da linguagem utilizada na API tende a ser irrelevante.

Observe, entretanto, que a definição de tecnologias implica em limitações. Um programa em C terá particularidades que um programa em JavaScript não terá e vice-versa. Essas limitações precisam ser mencionadas como limitações da prova de conceito que você está apresentando.

4.3. Validação da proposta

Esta é uma das partes fundamentais do trabalho: se estamos defendendo uma ideia, precisamos mostrar como pretendemos comprovar que essa ideia é boa. A estratégia de validação pode variar consideravelmente de um trabalho para outro, envolver usuários ou não mas, independentemente de qual for, deve ser explicada cautelosamente.

Critérios e técnicas a serem usados na validação devem ser apresentados com clareza, de modo que os leitores possam compreender como se dará a validação.

Se a pesquisa envolver a participação de usuários, um conjunto maior de informações deve ser apresentado:

• como foi o recrutamento dos participantes;
• a aprovação da pesquisa junto ao Comitê de Ética ou, caso se enquadre em dispensa, a justificativa para isso;
• o perfil dos participantes, incluindo dados demográficos e aderência ao estudo;

Em algumas pesquisas, teremos mais de uma avaliação com usuários. Nestes casos, adotaremos uma abordagem diferente, incluindo um capítulo para cada avaliação (e seus resultados).

Para apoiar este processo, é importante que você defina questões de pesquisa que possam ser respondidas de forma clara. Veja alguns exemplos:

• A solução que eu estou propondo resolve o problema?
• Os usuários percebem melhorias na minha solução quando comparada com a abordagem tradicional?

5. Resultados e discussões

Aqui está a cereja do bolo. É a hora de você apresentar os resultados alcançados a partir do processo metodológico descrito no capítulo anterior. Crie uma subseção para cada pergunta que você deseja responder, e que foi apresentada no capítulo anterior. Lembre-se de que, além de apresentar os resultados, você deve discuti-los.

Se a solução que você propôs parece ter sido eficiente, quais os fatores que podem ter contribuído para isso? Se ela não foi adequada, o que pode ter contribuído para este resultado desfavorável?

A discussão dos resultados é um aspecto crucial para um trabalho científico e revela a habilidade do autor em observar, discutir e prospectar diante de um cenário favorável ou não.

6. Considerações finais

6.1. Contribuições do trabalho

Aqui, em vez de simplesmente apresentar um resumão do artigo, você deve apresentar as conclusões, na seguinte perspectiva: o que o seu trabalho trouxe de novo para a comunidade científica? O que sabemos a partir dele que antes não sabíamos?

6.2. Produção científica

Se a sua pesquisa gerou artigos ou resumos, publicados ou em avaliação, liste-os aqui, indicando título, conferência/periódico, fator de avaliação e ano. Isso é muito importante para evidenciar as contribuições da sua pesquisa já percebidas pela comunidade.

6.3. Trabalhos futuros

Finalmente, um bom trabalho deve terminar com muitas oportunidades em aberto, a serem explorada por outros pesquisadores. A partir da sua experiência com a condução do trabalho, descreva pontos que ainda podem ser investigados por outros trabalhos.